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linguajar
(linguagem+ar2) vint, dar à língua; v. 1 movimento da língua; fusquinha: "mãe ele está linguajando para mim". 2 beijar: "e linguajaram-se".
murilo
por murilo | 1 comentário(s) »
13/03/2009
o sol se põe no horizonte,
[e não são nem quatro da tarde]
vai se enfiando a luz por baixo da terra,
e lá embaixo sem que ninguém suspeite
tudo se ilumina
e o dia nasce de novo
por outra perspectiva.
do alto só se veem os raios,
convergindo para o mesmo ponto
e enquanto lentamente o sol se abaixa
a terra geme e se contorce
num estupro que já dura
quase cinco bilhões de anos.
murilo
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10/03/2009
do que fui
sei muito pouco,
tanto
quanto do que serei.
dizem-me
agora,
instante.
dizem-me
[e tantas outras coisas dizem]
afora,
inconstante.
dizem
que não chego lá
vivendo assim
tudo num segundo.
dizem
porque não sabem
a velocidade
que gira meu mundo.
murilo
por murilo | 2 comentário(s) »
da série: "das conversas com J"
1
[...]
J _não é bem assim...
M _estou numa fase simplista da vida, tudo parece fácil.
M _não me importo com os caminhos que traçam nos meus sonhos, porque nem eu mesmo sei como é que vai ser.
J _rebelde!
M _não é bem assim...
murilo
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07/03/2009
de um bloco de pedra branca
esculpiu um homem.
estatura mediana,
expressão franca.
lapidou-o com esmero,
das ancas ao sorriso austero.
sabendo que só podia vê-lo,
desejou por um minuto tê-lo.
e com olhos lânguidos,
pele flácida,
chorou de forma tácita
aos pés da estátua.
antes que o austro forte,
sob o mar que tanto soçobra,
soprasse sua obra,
junto com seus desejos,
em direção à morte.
murilo.
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04/03/2009
ele de pelo,
ela de pele.
eles em pelos,
elas em peles.
eles e elas em pelo, em pele.
eles e eles em pelos,
elas e elas em peles.
eles em carne,
elas em alma.
deles o gozo,
delas a calma.
murilo
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27/02/2009
das conversas com J.
3
sentou-se e concluiu que não vinha.
esperou mais alguns minutos para se certificar.
não vinha.
levantou-se para ir e algo lhe chamou a atenção.
[...]
e cruzou os braços atrás do corpo,
balançou-se nos dois pés para frente e para trás.
e lentamente foi-se materializando a figura do homem.
murilo
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26/02/2009
people will ask my impressions of the country.
who i met there.
what the threat is like.
what ordeals.
what i went through.
and I'll reply,
nothing.
I saw nothing.
I simply met a man
who had killed his wife.
how can you show someone
that disconnected from life?
supposing this closed world around us
really is life.
murilo
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dilatou-se
contraiu-se
várias vezes.
pra cima
pra baixo
e de novo pra cima.
e todo o ar deixou de existir
por um minuto inteiro.
murilo
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das conversas com J.
2
_haveria de estar chovendo, fosse o que fosse.
_sim porque assim seria mais fácil de estarmos em lugares públicos.
_sim por causa da nossa falta de habilidade de estarmos onde precisamos estar e quando precisamos estar. portanto nos molharíamos.
_hum, verdade. haveria de estar chovendo.
murilo
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24/02/2009
das conversas com J.
1
e empurrando o carrinho, se distrairia com a música, balbuciaria alguma coisa da letra e, sem olhar pra frente, colidiria com outro carrinho no final do corredor. os condutores se olhariam, num primeiro momento com olhos de susto, e logo depois de espanto:
_você?
_opa!
e uma música muito mais sugestionável começaria a tocar.
murilo
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05/02/2009
situação 1:
"nada" usado para indicar a ausência de tudo, que por sua vez é o contrário de nada e indica a presença de todas as coisas menos o nada.
exemplo 1:
o universo, aquela coisa preta que, em algumas pessoas desperta curiosidade e em outras (e aqui me incluo) pavor é basicamente composto de nada.
paradoxo 1:
em primeiro lugar, porque existe uma palavra pra denominar algo que não existe? e se o universo é composto de nada então porque einsten ainda é aclamado como gênio da física pela sua teoria de que a terra pesa sobre o universo, o afunda razoavelmente e por isso temos o que chamamos de gravidade? a terra pesa sobre o que se ali não tem nada?
situação 2:
"nada" usado como nome próprio.
exemplo 2:
nadir se casou com fernando e como todo casal apaixonado se deram apelidos. na e nando. decidiram que se tivessem um filho o nome da criança seria a junção desses dois apelidos. se fosse homem, nado. se fosse mulher, nada. nasceu uma menina.
problemática 2:
a menina subverteria todas as expressões idiomáticas existentes. por exemplo: "não tem nada", ao que ela responderia: "isso foi uma pergunta ou uma afirmativa?", ao que lhe seria respondido: "como assim?", ao que ela diria: "você disse não tem nada, meu nome é nada, ou você afirmou que não tem nada ai ou me perguntou se não tem nada ai", e assim viciosamente.
situação 3:
"nada" usado como verbo na terceira pessoa do singular. ele nada.
exemplo 3:
um homem sentado numa cadeira de rodas acaba de chegar à praia. ninguém o nota porque é feio ficar olhando pras pessoas que não são perfeitas como nós. ele veste um calção de banho, o qual todos pensam ser apenas um traje de praia. lentamente ele se dirige à beira do mar e as pessoas em volta mandam à merda todas as convenções de não olhar pessoas com deficiência por mais de 2 segundos (tempo necessário para perceber que elas tem uma deficiência). e logo depois se joga no mar com cadeira e tudo. surpreendentemente ele sai nadando de braçadas e se duvidar conseguiria até pegar um jacarézinho. as pessoas na margem se perguntam: "ele nada?".
problemática 3:
não existe problemática. o cara é paraplégico e nada, qual o problema? nenhum, porque se tivesse algum eu estaria sendo preconceituoso...
murilo
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31/01/2009
uma mendiga
mundana e mundrunga
murmurou
uma mandinga maldita.
mandinga
mundana e mundrunga,
murmurou,
a maldita mendiga.
mandinga,
maldita.
mendiga
mundrunga.
murilo
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24/12/2008
negação
"não, não, não, NÃO!"
cólera
"É CULPA SUA! CULPA SUA! CULPA SUA! CULPA SUA!"
barganha
"por favor, por favor, por favor, por favor..."
depressão
"é culpa minha, culpa minha, culpa minha, culpa minha"
aceitação
"sim, sim, sim, sim"
murilo
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19/12/2008
o espelho mostrava o de sempre, o de toda manhã. um par de coxas finas, um par de pernas mais finas ainda que as coxas, um quadril franzino e um toráx com um quê de somaliano de onde se desprendiam duas longas tiras de pele que a ciência denominava braços ou membros superiores (que de superiores só tinham mesmo a posição). tudo isso mais a barba rala e a cara cansada. não importava em que espelho ou de que ângulo olhasse, a imagem continuava ali encarando-o com a mesma cara e as mesmas pernas. era assim todo dia, no quarto, no elevador onde a imagem o saudava com um adeusinho tímido e no carro, pelo retrovisor.
acostumado a tal condição não se importava mais que os ossos do quadril formassem pontas nem que os cotovelos parecessem esquadros, era tudo uma questão de escondê-los. por isso jamais frequentara praias de nudismo e nunca usara uma sunga, dadas as circunstâncias o melhor era mesmo um bom par de jeans e uma camiseta pra cobrir o que restou de massa. no entanto, esse também não era um trabalho fácil. era demasiado alto para não ser notado e os braços (ah! os braços) não negavam a magreza. se vestia uma camiseta sem mangas parecia um hidrante com duas mangueiras de bombeiro; se vestia uma camiseta de mangas longas parecia qualquer outra coisa igualmente comprida e magra.
um dia, olhando-se no espelho como fazia toda manhã antes do trabalho, percebeu algo que o incomodou e que não havia notado até então: como era grande seu pescoço! esticado como se alguém, enquanto ele dormia, secretamente puxasse sua cabeça para cima, cada dia um pouco até que ele finalmente começasse a crescer. só podia! não havia outra explicação, afinal de contas, não se lembrava de ter tanto pescoço ontem e, no entanto, ali estava o maldito a se esgueirar pelas beiradas do espelho.
nesse dia não conseguiu trabalhar. ficou pensando em pescoços, reparando nos colegas para ver se podia se confortar e encontrar uma girafa de escritório que pudesse lhe fazer compania ou lhe dar um conselho. nada, absolutamente nada. a savana estava deserta. definitivamente havia rinocerontes como o Silveira da contabilidade com seu nariz adunco e seu porte gordo; elefantes como o Marquinho do xerox que ele acreditava jamais ter levantado daquela cadeira e leões feito o Rubens que jurava um dia ter sido alterofilista, mas definitivamente nenhuma girafa. nenhum irmão igualmente pescoçudo, nenhuma mulher girafa africana que pudesse confortar a angústia de se sentir uma espécie em extinção, ou pior: um erro na cadeia evolutiva.
à noite sonhou com o crescimento exagerado do seu pescoço. imaginou que um duende vinha secretamente esticá-lo todas as noites logo após cair no sono (ele estava certo!), esticava-o durante horas a fio. até que um dia não conseguiu mais sustentá-lo e se viu arrastanto-o no chão no caminho até o escritório. imaginou-se como uma comprida tora de borracha mole, uma minhoca exageradamente grande esgueirando-se feito uma cobra cega por becos. e agora? o que os colegas de escritório iam pensar? o que o elefante do xerox vai dizer? espera... elefante? é isso!, pensou. é isso! e acordou coberto de suor com os imensos braços enrrolados em volta do pescoço.
acordou com torcicolo mas deixou de lado a idéia do duende, embora o torcicolo pudesse explicá-la perfeitamente, tinha uma idéia na cabeça e precisava anotá-la antes que lhe fugisse. mas o que era mesmo que tinha pensado enquanto dormia? alguma coisa com o Marquinho do xerox, alguma comparação, humm, deixe-me ver, ah! elefante!
decidira-se! engordaria! engordaria até que a banha enchesse todo o excesso de pele, feito a avó quando fazia chouriço enchendo as tripas de porco antes finas e moles até se tornarem grandes e viçosas. como ia fazê-lo ainda não sabia, mas isso não era segredo, mandar tudo o que visse pela frente já era um bom começo. ele que sempre fora de comer pouco, não por dieta; mas sim por hábito, agora comeria de tudo. abandonaria as saladas de que tanto gostava e partiria mesmo é pra batata e pros pães. na sua cabeça já era hora do dinossauro de pescoço comprido tornar-se tiranossauro rex, embora tivesse certeza de que os dois passavam bem longe um do outro na escala evolutiva.
naquela tarde os colegas se espantaram ao verem um imenso prato onde antes existia apenas algumas folhas e duas colheres de arroz e uma de feijão. comeu tudo com gosto, ou melhor, fingiu gosto. depois da terceira colheirada o estômago desacostumado e o metabolismo rápido imediatamente iniciaram um processo de entupimento que ele disfarçou com um sorriso meio amarelo (isso aqui está uma delícia!) na mesa da lanchonete da empresa. entre as conversas com Geraldo (o secretário da mesa ao lado, que, pela cara, não estava entendendo nada do que acontecia) e os imensos goles de suco pra lubrificar a garganta, engoliu tudo, não sobrou um grão de arroz.
sentiu-se mal o resto do expediente todo. tinha vontade de vomitar mas não o faria, do contrário todos os carboidratos e as proteínas se esvairiam privada abaixo. controlou-se. às seis da tarde, pouco antes de bater o cartão do ponto, foi acometido de uma feroz vontade de ir ao banheiro mas, novamente, controlou-se. estava decidido à absorver cada molécula que pudesse lhe acrescentar alguns quilos.
e assim seguiu-se a dieta da engorda durante várias semanas. tirando a constipação e o mal estar após cada refeição estava bem, mas o peso ainda continuava insatisfatório. o pescoço, as pernas, as coxas e os braços continuavam finos e a barba rala estava ainda mais rala e cansada. engordara, isso é fato, mas não a quantidade que precisava para sumir com toda aquela magreza.
não desanimou. o efeito é à longo prazo, pensou consigo e meio que instintivamente continuou a comer feito uma draga ignorando os impulsos do estômago que se recusava a dilatar para receber mais uma colher de comida. por seis meses comeu feito um porco, tudo de mais calórico, tudo de mais gorduroso até que o coração não agüentou a dieta.
deu entrada às seis da tarde no hospital municipal trazido pelo amigo Geraldo que, em meio aos berros dos colegas tentava resgatá-lo de se afogar no próprio prato de feijão que ele insitira em pedir no happy hour. parada cardíaca. o colesterol estava nas alturas. o fígado também não estava bem e as artérias indicavam o início de um entupimento geral. o médico não deu esperanças e muito menos explicou o porque da pane. Geraldo não parava de se perguntar como uma pessoa magrela podia morrer de problema de gordo. se fosse o Marquinho talvez sim.
deitado na cama, semi-consciente, imaginou-se numa savana aberta (devia estar delirando por causa do remédio). suou frio. vislumbrou um bando de girafas que corriam soltas e selvagens por dentre as árvores esparças. percebeu como eram graciosas com suas pernas esticadas e seus longos pescoços inclinando-se para frente de modo a cortar o vento e diminuir seu atrito. percebeu que não estava sozinho e desejou com todas as forças que pudesse correr entre elas. tentou inutilmente mexer as pernas, mas isso só fez com que o pi pi pi do monitor ao qual estava conectado esguelasse para todo o hospital e alarmasse ainda mais um afoito Geraldo que veio correndo à cama sussurando "sossega ai camarada, o médico disse pra não se mexer".
o coração parou às oito da noite do mesmo dia. Geraldo deu a notícia no escritório, por telefone, com a voz meio engrolada. disse que o médico não explicou direito, parece que morreu de tanto comer.
murilo
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12/12/2008
class room, hot night, noise fans
first person camera/far away vision
a man with a white t-shirt sitting in the first chair of the row in the right, right beside one of the noises fans.
camera shows the man. focus on the sweat drop sliding of his neck to the shirt. the noises of the fan become more intense. another drop slide from the neck. camera follows the moviment of the man's hand. his arm is hairy, the hairs are wet of sweat.
first person camera/close
man's t-shirt becoming wet. sweat drops running on his back. camera closes on a sweat drop that falls into the table (slow motion). the man rub the hand in the forehead. camera closes on the sweat sliding on his hand. the man blows with the mouth.
teacher's voice to anyone in particular (loud): GUYS! HEY, ARE YOU LISTENING TO ME?
first person camera/far away vision
camera turns fast to the teacher's face. the teacher is sitting a little bit behind the viewer, in the last row of chairs in the right. close on teacher's face. he's not mad with the viewer. camera make the same moviment right to the man that was been watched before. there are no sweat. the man is concentrated on the class.
the noises of the fans become less intense. a blow of wind open the door a little bit.
CUT.
murilo
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07/12/2008
a porta abre, fecha.
dois segundos de luz, de fresta.
dois metros da cama à porta.
dois passos, a cena corta.
dois corpos nús em pêlo, quanto pêlo. Quatro mãos desdadas.
pernas demais, braços demais. Caminhos demais pra desbravar.
pés que descem, sobem, tocam, levantam morros.
olhos que fechados apontam pro teto, gemidos que escorrem do forro.
a cama, a planície regida pelo atrito.
os corpos que se encaixam,
o gozo,
o grito.
já é tarde. A fresta não mais disfarça. O dia vem, não bate à porta trancada.
um corpo sai. Um corpo fica.
algumas pernas procuram roupas, algumas mãos tateiam caminhos.
uma rótula estala, um joelho range.
uma porta abre, fecha.
o quarto silencia,
o atrito cessa,
e o sol deixa visível o prazer que escorre pela parede.
murilo
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03/12/2008
eu devo ser muito besta ou muito egoísta, ou muito besta e egoísta tudo de uma vez só. acho que me faltou o pingo de altruísmo que vem de fábrica, não que tenha me faltado a compaixão - isso nunca - mas compaixão pensada não chega nem a ser compaixão, ou chega?
estou pagando a língua, como dizia minha irmã, um dia essa língua preta cai. boca praguenta a dela. e se a língua ainda não caiu, a orelha está prestes à, já explico o porque. o problema comigo é que só me importo com o chamado próximo quando estou bom, enquanto estou mau, bom, ai o leonino fala mais alto, olhos só tenho pra mim.
de volta a questão da orelha. fazem três dias hoje que eu estou internado num quarto com três desconhecidos, a situação não vem ao caso - porque o meu objetivo não é me martirizar. daqui de onde estou sentado tenho uma visão geral dos quatro cantos do aposento. a porta bem à frente onde as enfermeiras passam. parênteses, digo enfermeiras, assim no feminino plural, porque os preconceitos têm fundamento - homem enfermeiro é a mesma coisa que mulher enfermeira, frescos, fecha parênteses.
um pouco pra esquerda, na diagonal tem o sujeito que me fez perceber que não passei na fila do altruísmo. não está doente e fica sentado o dia todo, anda só o necessário pra amparar o pai que mais parece uma estátua velha e magra de buda. sempre com as pernas dobradas e cochilando, um pé enfaixado e uma careca idosa. ao filho do buda também é necessário dizer que fala, fala muito, uma voz de caipira genuíno que me lembra meu tio dilo falando.
no canto, mais pra lá do filho do buda, tem o senhor de bigode que até hoje eu não sei o que tem, pelo menos não é aparente, deve ser grave. grave também é a voz dele, sempre que ouço me viro pra certificar meus ouvidos que sei de onde vem aquele som. é uma voz abafada, meio metalizada, no começo achei que estivesse com aqueles tubinhos de respirar pela garganta - mas a voz é dele mesmo. e, enfim, a última das figuras - e a mais estranha - é o nordestino que mora na cama adjacente à minha, olhando assim parece que não tem é nada, mas de noite - quando tira a camisa pra vestir o pijama - posso notar a cicatriz do umbigo até o limite do púbis - intestino na certa. é o mais estranho dos três, está doente e não pára de sorrir. fala pelos cotovelos como se não houvesse lá fora, só esse quarto de hospital. como fala! junta com o filho do velho buda e engata uns papos sobre pescaria, trabalho e religião que eu fico só escutando e desejando não ter de escutar. é do tipo que chama a esposa de muié, como se fosse um objeto, acho de uma ignorância tamanha, mas não falo nada. dos papos deles nada salva, nada. e o que mais irrita é quando usam os diminutivos e aumentativos em lugares errados. o filho do buda acabou de dizer carnona, carnona, onde já se viu... fora quando não engolem o plural das palavras, as menina, as carne, as moça. acho que isso me irrita mais, eu me seguro. me faltou a piedade mas não me faltou o controle. mandar esses velhos à merda - a essa altura do campeonato - não vai adiantar em nada.
como gesticulam esses velhos. parecem dois pescadores bem burros contando uma mentira bem grande sobre a pescaria de ontem. são tipos. o buda velho eu nem conto porque ele mais dorme do que faz qualquer outra coisa. já os outros são uns caipiras, no sentido pejorativo, porque eu sou caipira e não sou burro assim.
mas nem tudo é de todo mal. as enfermeiras - por exemplo - sucetíveis e desprovidas de qualquer emoção e conhecimento que não seja técnico. veja você que uma delas me chamou de culto por estar lendo João Ubaldo Ribeiro - que ela nem sabia quem era, coitada. não a culpo, na verdade encaixo-a na categoria de quem não teve sorte na vida, mas em aspecto algum são como esses chucros que só vivem de passado e falam alto. as coitadas pelo menos sabem pegar uma veia como ninguém, isso tem seu mérito...
murilo.
por murilo | 1 comentário(s) »
29/11/2008
dizem que, a uma certa idade, nós as mulheres nos fazemos invisíveis. que nossa atuação na cena da vida diminui e que nos tornamos inexistentes para um mundo onde só cabe o impulso dos anos jovens.
eu não sei se me tornei invisível para o mundo, mas pode ser. porém nunca fui tão consciente da minha existência como agora, nunca me senti tão protagonista da minha vida e nunca desfrutei tanto cada momento da minha existência.
descobri que não sou uma princesa de contos de fadas; descobri o ser humano sensível e também muito forte que sou. com suas misérias e suas grandezas. descobri que posso me permitir o luxo de não ser perfeita, de estar cheia de defeitos, de ter fraquezas, de me enganar, de fazer coisas indevidas e de não corresponder às expectativas dos outros.
e apesar disso… gostar de mim.
quando me olho no espelho e procuro quem fui, sorrio àquela que sou. me alegro do caminho andado, assumo minhas contradições. sinto que devo saudar a jovem que fui com carinho, mas deixá-la de lado porque agora me atrapalha. seu mundo de ilusões e fantasias, já não me interessa. é bom viver sem ter tantas obrigações. que bom não sentir um desassossego permanente causado por correr atrás de tantos sonhos.
“a vida é tão curta e a tarefa de vivê-la é tão difícil que quando começamos a aprendê-la, já é hora de partir"
minha mãe (do murilo)
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